Carnaval ou Entrudo

Carnaval ou Entrudo





Entre os antigos egípcios havia as festas de Ísis e do boi Ápis; entre os hebreus, a festa das sortes; entre os gregos antigos, as bacanais; na Roma Antiga, as lupercais, as saturnais. Festins, músicas estridentes, danças, disfarces e licenciosidade formavam o fundo destes regozijos. Por seu lado, os gauleses tinham festas análogas, especialmente a grande festa do inverno a que é marcada pelo adeus à carne e a partir da qual se fazia um grande período de abstinência e jejum, como o seu próprio nome em latim "carnis levale" indica.
Do ponto de vista antropológico, o carnaval é um ritual de reversão, no qual os papéis sociais são invertidos e as normas de comportamento são suspensas.Na Antiguidade, os povos consideravam o inverno como um reino de espíritos que precisavam ser expulsos para que o verão voltasse. O Carnaval pode assim ser considerado como um rito de passagem da escuridão para a luz, do inverno ao verão: uma celebração de fertilidade, a primeira festa de primavera do ano novo. Várias tribos germânicas celebravam o retorno da luz do dia. O inverno seria afastado, para se certificar de que a fertilidade poderia retornar na primavera. Uma figura central desse ritual era possivelmente a deusa da fertilidade Nerto. Além disso, há indicações de que a efígie de Nerto ou Frey era colocada num navio com rodas e acompanhada por uma procissão de pessoas disfarçadas de animais e homens vestidos de mulheres. A bordo do navio um casamento seria consumado como um ritual de fertilidade.
Em muitos sermões e textos cristãos, o exemplo de uma embarcação é usado para explicar a doutrina cristã: "a nave da igreja do batismo", "o navio de Maria", etc. Os escritos mostram que eram realizadas procissões com carruagens semelhantes a navios e festas sumptuosas eram celebradas na véspera da Quaresma ou a saudação da primavera no início da Idade Média. No entanto, a Igreja Católica condenava o que chamava de "devastação diabólica" e "rituais pagãos". Já no ano 325, o Primeiro Concílio de Niceia tentou acabar com estas festas pagãs.
O período quaresmal do calendário litúrgico, as seis semanas imediatamente anteriores à Páscoa, foi historicamente marcado pelo jejum, estudo e outras práticas piedosas ou penitenciais. Durante a Quaresma não havia festas ou celebrações e as pessoas abstinham-se de comer alimentos ricos como carne, laticínios, gordura e açúcar. As primeiras três eram muitas vezes totalmente indisponíveis durante o final do inverno. O Carnaval na Idade Média não durava apenas alguns dias, mas quase todo o período entre o Natal e o início da Quaresma.
O Papa Gregório Magno (590-604) decidiu que o jejum começaria na quarta-feira de cinzas. Todo o evento carnavalesco era estabelecido antes do jejum, para criar uma divisão clara entre o pagão e o cristão. Também era costume durante o Carnaval que a classe dominante fosse achincalhada através do uso de máscaras e disfarces.
Livros de confissão de cerca do ano 800 contêm mais informações sobre como as pessoas se vestiam como animais ou idosos durante as festas em janeiro e fevereiro, mesmo que isso fosse considerado um pecado.
A designação «Entrudo», ainda muito utilizada entre nós, principalmente no meio rural, do latim introitus (intróito), apresenta igual significado: o de introduzir, dar entrada, começo ou anunciar a aproximação da quadra quaresmal. Em Portugal, uma das primeiras referências ao Entrudo encontra-se num documento datado de 1252, no reinado de D. Afonso III, embora não propriamente relacionado com as festividades carnavalescas, mas com o calendário religioso.
Na época de D. Sebastião, são várias as menções que salientam as brincadeiras do Entrudo, entre elas a do «lançamento de farelos», que nem sempre acabavam bem. Entrudos (ou entruidos) é também o nome atribuído em diversos lugares aos próprios mascarados, consoante as regiões de Portugal.

Texto: Clementina Braga

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